O corpo doente: uma linguagem para as nossas emoções
Hipócrates, estudioso grego considerado o pai da medicina, já no século IV a.C., afirmou existir uma relação entre corpo, mente e ambiente criando uma teoria com base nas proporções de quatro humores corporais a que chamou sangue, fleugma, bílis amarela e bílis negra. Os estados de equilíbrio destes humores corporais ditariam um estado de saúde ou no seu reverso os estados de doença e dor.
Muitos anos avançaram e hoje sabemos que o Sistema Límbico, parte do nosso cérebro ligado às emoções, está também ligado ao eixo neuro endócrino (regulador hormonal) e neurovegetativo (regulador de funções vitais involuntárias, como a circulação sanguínea, a respiração e a digestão). Cada vez mais estudos mostram a importância da atuação emocional nas doenças somáticas, seja por interferência direta no sistema neurológico, seja modificando as barreiras imunes do organismo, o que nos desafia a uma visão mais holística sobre a natureza humana.
As Perturbações Somatoformes (que incluem a Perturbação de Somatização entre outras) são uma categoria de diagnóstico clínico dentro das perturbações mentais que se caracterizam pela manifestação de sintomas físicos diversos e às vezes múltiplos, acompanhados de sofrimento psicológico e mal-estar emocional. Embora se assemelhem a doenças físicas não têm na sua origem qualquer causa física ou biológica. A manifestação destes sintomas é habitualmente prolongada no tempo e interfere significativamente na qualidade de vida do paciente: na sua área social, familiar, profissional.
Ao contrário das Perturbações Factícias em que os sintomas são simulados, nas Perturbações Somatoformes os sintomas são genuinamente vivenciados pelo paciente. Assume-se que um conjunto de fatores psicológicos contribuem para o seu início, intensidade, duração e curso e, portanto, existe uma questão emocional como fator causal, facilitador ou potencializador da doença.
A doença física, pode ser compreendida com origem num problema psicológico desempenhando um papel importante: o de comunicar o que o corpo e mente querem expressar, mas que a nossa voz é incapaz de reproduzir, ou o consciente de elaborar.
Segundo Ruediger Dahlke (médico e psicoterapeuta que desenvolveu trabalho com base na premissa de que a doença é um símbolo) cita por exemplo:
O corpo engorda porque a insatisfação aperta; O estômago arde quando a raiva não consegue sair; A dor de garganta entope, quando não é possível comunicar aflições; O peito aperta, quando o orgulho escraviza; A dor no ombro denuncia o excesso de fardos e preocupações; A dor de cabeça deprime quando as dúvidas aumentam.
Desta forma, o sintoma psicocorporal pode ser visto como uma expressão de sofrimento que não encontrou outra tradução. É necessário então criar vias de capacitação para que esse sofrimento encontre outro acesso mais funcional, restaurando e modificando essa capacidade expressiva e acima de tudo facilitando o encontro do seu núcleo interno mais vivo.
São muitas as formas de apresentação das doenças psicossomáticas, ou que podem derivar ou agravar a partir de causas psicológicas associadas a traumas e eventos emocionais. São exemplos: a enxaqueca, síndrome do intestino irritável, gastrite, alergias alimentares, alergias de pele e ou respiratórias, disfunções sexuais, infertilidade, entre outras.
Curiosamente e embora não existam estudos ou evidências científicas, muitos doentes com doença cancerígena correlacionam o surgimento da mesma posteriormente à vivência de períodos prolongados de stress, de eventos de vida extremamente marcantes ou traumatizantes, ou até mesmo a uma tristeza profunda. No entanto temos uma evidencia científica, a tristeza profunda é imunodepressora, o que significa que vivermos profundamente tristes durante demasiado tempo sem que essa tristeza seja gerida, nos debilita fisicamente.
A consciência emocional e a expressão e gestão adequada das nossas emoções tornam-se portanto muitíssimo relevantes não apenas para a nossa saúde psicológica, mas para a nossa saúde física também.
O acompanhamento psicoterapêutico é precioso para promover a identificação de bloqueios, emocionais e mentais, e identificar a necessidade legitima do SER que está a ser bloqueada e que não encontra a sua via de expressão.
Com isto, importa face a um estado de doença e sintomas físicos, que as causas orgânicas, devam ser sempre previamente descartadas. A intervenção psicoterapêutica, que inclui também uma componente psicoeducativa, ajuda o paciente a compreender as relações entre as suas vivências emocionais e funcionamento mental e as variações dos sintomas, contribuindo para a condução de uma reavaliação (ou nova perceção) do estado físico em termos psicoemocionais, diminuindo o mal-estar e alterando comportamentos com vista à diminuição, e eliminação dos sintomas.